A empolgação do professor conta pontos na sensibilização ambiental dos estudantes

Por Cristina Rappa

Eu acredito na combinação de alguns fatores para que um educador tenha sucesso em relação ao desempenho de seus alunos na escola, na sua vida profissional e – por que não? – pessoal: boa estrutura e apoio por parte da instituição de ensino, contar com materiais adequados, ter metodologia, e inspiração e motivação. A motivação e o interesse por parte dos professores fazem toda a diferença e acabam contagiando os estudantes, penso. Pelo menos aqueles que se encontram no meio da Curva de Gauss.

“Eu costumo me empolgar”, reconhece a Profa. Ermelinda Gandra Araújo Costa, que dá aulas em Timóteo, município mineiro situado no chamado Vale do Aço, a mais de 200 km de Belo Horizonte. A auto definição é precisa.

Conheci a Profa. Ermelinda em 2017, quando ela e seus colegas receberam uma orientação da diretoria do Centro Educacional Católico do Leste de Minas Gerais, em que lecionava, para que fosse seguida a linha da Campanha da Fraternidade daquele ano, que destacava a importância da preservação ambiental. Ela acabou escolhendo o meu livro Topetinho Magnífico (Ed. Melhoramentos, 2012) para trabalhar com seus alunos do 4º ano do ensino fundamental do ensino fundamental na mostra literária bienal que aconteceria no colégio naquele ano, e fez contato comigo para trocar ideias e mostrar os trabalhos que estavam desenvolvendo.

“Gosto de trabalhar com meus alunos obras literárias relacionadas a temas ambientais e me apaixonei de cara pelo Topetinho e seus amigos emplumados”, conta-me ela. “Se conseguirmos plantar a sementinha da preservação do ambiente na cabeça e no coração deles, já estamos fazendo muita coisa pelo planeta”, completa a professora mineira.

Além de se interessar pela conservação da natureza e acreditar no potencial das crianças como multiplicadoras dessas mensagens em suas casas e comunidade, a Profa. Ermelinda aposta no potencial da arte para sensibilizar e servir de meio para divulgar esse discurso conservacionista.

Nessa linha, incentiva seus alunos a contarem as estórias em desenhos, pinturas, maquetes, peças de teatro, poesia e cordel, entre outras formas de expressão. Sem falar nas redações, em que dão suas versões do texto lido e discutido em classe. “Eles representaram bem a história do Topetinho de diversas formas”, conta ela, falando especificamente sobre um dos meus livros.

Rio Doce

Timóteo está inserido na região do Vale do Aço e do Parque Estadual do Rio Doce, o mesmo rio que sofreu com o rompimento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana, MG, em novembro de 2015. Além da tragédia em Mariana, que afetou bastante o rio e toda região, Ermelinda menciona uma grande queimada que o parque teria sofrido em 2019. Ela acabou sendo controlada, mas a vigilância constante por parte da população é fundamental para se evitarem incêndios não só criminosos como acidentais, criados a partir de uma queima imprudente de lixo ou de uma soltura de um balão, por exemplo.

“Procuro passar para meus alunos os cuidados que temos que ter com o nosso meio ambiente”, diz, ciente de que esses aprendizados “são para o bem de todos”.

Além dos trabalhos desenvolvidos a partir dos livros, a Profa. Ermelinda coordena outras atividades com seus alunos. Como os programas de observação de aves, realizados em parques da cidade, como o Centro de Biodiversidades de Usipa (Cebus), da Usiminas. No ano passado, o projeto Xerimbabo, criado dentro da plataforma de educação ambiental da Usiminas teve como tema “Eu vi um passarinho”. E lá estavam Ermelinda e sua turma de alunos. E não é que o grupo fez até um lifer, termo que se dá ao primeiro registro de uma espécie, para o lugar?

Estudantes consultam guia de aves, para tentar identificar as que avistaram no parque.

Escola pública

Aí a gente tende a pensar que não desenvolver essas atividades e obter boa resposta por parte de alunos de uma escola particular não é grande desafio. E se fosse uma escola pública, onde as condições costumam ser mais precários, os estudantes têm menos acesso a recursos e são normalmente menos estimulados em casa?

Pois a Profa. Emerlinda também dá aulas em uma escola pública do ensino fundamental da cidade, e levou em 2019 o Topetinho para lá e aconteceu a mesma coisa: sentiu a mesma boa receptividade por parte dos alunos com o tema. “Eles amaram e fizeram trabalhos lindos”, afirma a educadora, completando que nessa escola pública, “os pais são bastante presentes e parceiros da escola e abraçam as causas junto conosco”.

Seu entusiasmo só arrefece um pouco quando fala das restrições impostas pela pandemia: “O ensino remoto está uma loucura! Amo o que faço, que é estar em sala de aula, e não poder ver os alunos presencialmente é muito difícil”, lamenta.

E daqui para a frente, para quando a pandemia passar?, pergunto à professora sobre seus planos.  Continuar o seu trabalho de sensibilização para as causas ambientais com suas turmas de alunos e “fazer um comedouro para os pássaros que aparecem no sítio do meu tio, em Tijuco Preto, para onde costumamos ir nos momentos de folga”, responde rapidamente e com convicção.

“Saímos da roça, mas a roça não saio de mim até hoje”, explica a professora mineira, com um riso maroto.

Nota: Artigo publicado originalmente no site FaunaNews.

Topetinho vai à escola

Será que criança curte estórias de passarinho? Esta dúvida apareceu quando a Editora Melhoramentos me convidou para contar a estória do meu primeiro livro infantil, Topetinho Magnífico, em escolas de municípios paulistas, após seu lançamento, em junho de 2012.

Jornalista de formação, com experiência em jornais diários, revistas e em comunicação corporativa, eu só tinha até escrever o livro experiência em falar com adultos.

Sempre gostei de animais, especialmente os silvestres, e suas causas sempre me interessaram e tocaram. Com interesse em ciências biológicas, acabei indo para o jornalismo dada a minha paixão pela leitura e redação, e dentro do jornalismo acabei atuando em editorias ou veículos especializados em ciências, meio ambiente e agricultura.

Quando saí de um cargo executivo em uma multinacional norte-americana e em fase de guinada na vida, veio a sugestão, por parte de uma amiga que já havia publicado mais de uma centena de livros para crianças, de escrever um livro para esse público, uma vez que as escolas estavam demandando mais textos com cunho de preservação ambiental.

Bom, sabe aquela dúvida que mencionei sobre os eventos com as crianças? Pois bem, apareceu pela primeira vez. Será que eu iria me dar bem escrevendo para esse público? Eu nem filhos tive. E linguagem meio gugu-dada, que idiotiza a criança, eu não iria conseguir fazer. Acho que nem era esse o propósito da editora.

Eu nem tinha começado a observar aves, mas fui ao lançamento de um guia de aves de ornitólogos, editado pela empresa de um conhecido, e folheando o material me encantei com um beijaflorzinho muito pequeno (cerca de 4,5 cm), com um lindo topete vermelho, endêmico do Brasil e existente em nossa mata atlântica e cerrado. Foi o clique.

Pesquisas e estudos mais tarde, nascia a estória do passarinho que foi caçado por traficantes de aves silvestres, para ser vendido em feiras de grandes cidades brasileiras ou “exportado” para fora. Afinal, há gringos que criticam o Brasil por desmatar a Amazônia mas adoram desfilar com uma arara ou papagaio dos trópicos.

Entre os personagens, além do Lophornis magnificus, o Topetinho Magnífico que dá nome ao livro, outras aves bonitas ou ameaçadas, como o bicudo (grande vítima das gaiolas, em função de seu canto lindo) e o picapau-de-parnaíba (Celeus obrieni), dado como extinto até ser redescoberto no interior do Tocantins no começo dos anos 2000 cerca de oitenta anos sem ser observado.

Para tratar um tema tão sério como o comércio de animais silvestres para crianças, resolvi lançar mão de muita ação, diálogos e até humor. Não é porque o tema é sério que o texto precisa ser sisudo, né?

Mandei o texto para Editora Melhoramentos e – um pouco para a minha surpresa, sem falar na alegria – logo veio o contrato para assinar. O livro seria oferecido em escolas do ensino fundamental em todo o Brasil. Fiquei muito contente, porque seria uma oportunidade para as crianças tomarem conhecimento do tema do tráfico de animais silvestres. Mais tarde, o abordaria em outra mídia: um artigo na Folhinha, o encarte infantil que a Folha de S. Paulo publicou por anos.

Livro ilustrado com maestria por Maurício Veneza, diagramado, impresso e lançado, começaram os eventos com as crianças, em escolas que já tinham adotado o material ou que o adotariam.

Não é que a experiência com crianças foi ótima e me cativou? Taí um público que se interessa, participa, conta suas experiências (escutei muitos casos das caçadas do tio, do papagaio da avó…), dá sugestões (“Tia, por que o Topetinho, que tem asas, não vai viajar?”, “Por que o Topetinho não conhece uma Topetinha, se apaixona perdidamente e se casa?”, e por aí vai), faz perguntas.

Crianças em entidade de apoio à educação na zona sul de SP assistem a uma das palestras.

Gostei da experiência e não parei mais, levando o Topetinho e os temas da preservação ambiental e da valorização da nossa rica biodiversidade por meio das aves a escolas e/ou entidades com crianças carentes de diversos locais. Minha ideia era plantar sementinhas e sensibilizar as crianças para serem multiplicadoras dessas mensagens visando a mudar a realidade da caça e da gaiola, ainda forte em várias regiões do país, inclusive na periferia das nossas grandes cidades. Além de uma crueldade, uma forte ameaça à nossa biodiversidade.

Em uma dessas atividades, a professora organizou uma peça de teatro com o tema, representada por crianças que viviam em situação de precariedade em bairros pobres da capital paulista. Foi uma emoção! E Fábio, o menino filho de catadores de materiais recicláveis em São Paulo que viveu o Topetinho, pintou o topete de vermelho e encarnou com maestria, na forma e no conteúdo, o passarinho. A professora me contou depois que a atuação dele surpreendeu a todos, uma vez que ele costumava ser muito tímido e que quase não se expunha. Pelo visto, o Topetinho deu o clique em Fábio também. Transformador esse topetinho!

Depois de Topetinho Magnífico, eu lançaria mais dois outros livros infantis tendo aves como heróis: O Soldadinho da Caatinga (Florada Editorial, 2018) e O Tiê da Mata Atlântica (Florada, 2019). Bom, mas isso fica para uma outra coluna…

Fábio, que estuda na Unibes, em SP, encarnou o Topetinho em peça na escola.

*Este texto, de autoria de Cristina Rappa, foi publicado originalmente no portal Fauna News.

Acompanhando uma família de arirambas

Cristina Rappa

Durante a temporada de isolamento imposta pelo novo coronavírus na fazenda, no sul de Minas, pudemos observar melhor a natureza e seus movimentos, e, entre eles, acompanhar o comportamento das aves daqui. Que são muitas.

Em outras ocasiões, eu já mencionei, neste mesmo blog, a biodiversidade encontrada em Arceburgo, região de transição entre mata atlântica e cerrado onde já foram registradas, com foto e/ou som, 273 aves. Em uma caminhada pelos arredores da casa, por exemplo, não é difícil avistar cerca de 40 espécies de aves.

Cristina Rappa
Uma ariramba em busca de insetos. Reparem no bico comprido, parecendo uma agulha

Uma das espécies muito comuns por aqui e que já faz parte do nosso círculo de amigos (meu marido já as identifica pelo som), é de pássaros muitos simpáticos e vistosos, as arirambas-de-cauda-ruiva (Galbula ruficauda).

A ariramba, também conhecida como bico-de-agulha, mede cerca de 25 cm, tem um bico comprido (daí o segundo nome popular…), que lhe permite caçar bem insetos voadores, como vespas, borboletas e libélulas, que constituem seu cardápio básico. À primeira vista, para quem não a conhece, parece um beija-flor grande.

O casal costuma estar sempre junto, sendo o macho o de papo mais branco (esq.)

Costumam ser avistados em casais, sendo que o macho tem o papo mais branco do que a fêmea, e não são ariscos. Pelo contrário, acostumam-se bem à presença das pessoas. Para falar a verdade, até fazem questão de chamar a atenção dos humanos. Pelo menos, é isso que observo por aqui, toda vez que ando pelo jardim ou na borda da mata.

Há alguns anos um casal mora e faz ninhos no barranco em volta da casa aqui de Minas. O ninho da ariramba não é como um ninho comum de pássaros, como a gente costuma ver, feitos com gravetos colocados em galhos de árvores. A ave cava buracos em barrancos, onde bota os ovos e de onde entra e sai com frequência para alimentar os filhotes. Ótima solução para proteger a ninhada, enquanto pequena, de predadores, como gaviões e tucanos. Que, por sinal, são bem numerosos por aqui.

A ariramba mãe entra no ninho, feito no barranco, para alimentar os filhotes.

Esta é uma das minhas curiosidades: os filhotes. Nunca vi um. Imagino que eles devam colocar a carinha para fora do buraco para olhar o mundo em volta, e depois ensaiar seus primeiros voos. Quem sabe ainda dou sorte e vejo um, sem assustar os pais?

Enquanto escrevo esta crônica, chega uma poderosa frente fria por aqui, que baixas as temperaturas a sete graus Celsius em pleno mês de maio. O lado bom é que veio após dois dias de uma boa chuva, o que é sempre positivo para a natureza.

Mas quando a temperatura caiu fiquei três dias sem avistar o casal de arirambas. Será que estão recolhidos dentro do ninho, para se protegerem do frio, fiquei me perguntando. “Vai ver os filhotes já estavam na fase de abandonar o ninho”, tenta me consolar meu marido.

Hoje vi o macho na árvore ao lado do ninho. Pena que ele não conseguiu responder à minha dúvida.

Uma ariramba fêmea almoçando na beira da mata

Nota de atualização em 31 de maio: hoje avistei os pais em volta do ninho, caçando insetos e levando-os para dentro do buraco, para alimentar os filhotes, imagino. Fico feliz! Ainda com esperança de ver os pequenos.