Aves como ferramenta de educação

Cristina Rappa

Dupla de biólogos viaja de moto pelo Brasil registrando os pássaros e fazendo ciência-cidadã

Caio e Tati RPPN VeracelEm 2012, o biólogo Caio Bezerra de Mattos Brito empreendeu uma ousada viagem, sozinho, a bordo de uma moto de 125 cilindradas, de Fortaleza, onde morava, a Ubatuba, litoral de São Paulo, e ao Pantanal sul-mato-grossense, voltando meses depois ao Ceará. A aventura rendeu muitas aves avistadas, muito conhecimento acumulado, histórias para contar e um livro muito gostoso de ler (Um Caderno e Uma Moto – Narrativas de uma Viagem, 2014), com que sou brindada durante visita à RPPN Estação Veracel, da Veracel Celulose, em Porto Seguro/BA, onde o conheci. 

Caio e sua atual companheira de passarinhadas em duas rodas, a consultora ambiental Tati Pongiluppi (com ele, na foto acima), assinam a coordenação do projeto Expedição Tesouros do Brasil, que, em etapa patrocinada pela empresa sueco-brasileira de celulose, mapeou as aves dos mais de 6 mil hectares da RPPN, resultando em um material de educação ambiental. “Nossa ideia é que este material inspire as pessoas”, diz Tati, que acompanhou Caio durante 3 meses, viajando na garupa da moto. Para ela, “a observação de aves transforma olhares, ações e a nossa própria vida”.

“Observo aves há uns seis, sete anos e afirmo que é viciante”, reforça o rapaz durante encontro com os jornalistas convidados pela Veracel para conhecer o da RPPN. Para a dupla de biólogos, as aves são uma ferramenta de educação.

No que concorda a equipe da Estação Veracel. “Procuramos, por meio da educação ambiental, reverter a forma de geração de renda baseada na caça, para a formação de condutor de avistamento de aves, despertando nessas pessoas o interesse e o orgulho em guiar e mostrar os pássaros da região às pessoas”, conta a biologia Virgínia Londe de Camargos, coordenadora da Estação Veracel.

Expedição: ferramenta de educação ambiental

Expedição: educação ambiental

Riqueza ambiental

A equipe da Veracel tem justificável orgulho da Estação. Nela já foram registradas 270 espécies de aves, das 352 já avistadas na chamada Costa do Descobrimento, no remanescente de mata atlântica do sul da Bahia, onde está inserida.

E não são aves-quaisquer. Mas sim espécies ameaçadas, como o lindíssimo e endêmico [exclusivo daquela região] crejoá (Cotinga maculata) e a impressionante harpia (Harpia harpya), ou gavião-real, ave muito rara na mata atlântica, sendo encontrada mais facilmente na Amazônia.

De setembro de 2017 a agosto de 2018, quando visitei a Estação, cerca de 700 pessoas tinham passado por lá para observar aves. “Incentivamos a prática de observação de aves como estratégia de turismo sustentável e lazer nas áreas protegidas”, explica Virgínia.

A equipe da bióloga organiza programas de educação ambiental com crianças e com a população em geral da região, para sensibilizá-los ainda no combate à caça e ao tráfico de animais silvestres. No ano passado, coordenaram o I Workshop de Combate à Caça e ao Tráfico de Animais Silvestres. O tráfico de animais silvestres é problema sério no Brasil, ameaçando nossa biodiversidade, sem falar na crueldade com os animais. Trata-se do terceiro maior comércio ilegal, após os de drogas e armas, estando muitas vezes ligado a estes.

Preservada e com grande biodiversidade arbórea, a Estação Veracel não registra apenas aves lindas e consideradas ameaçadas. Suas armadilhas fotográficas já registraram até onça pintada andando por suas matas, conta Virgínia.

Veracel - Jailson e Cri passarinhando agosto18E lá vou eu passarinhar um pouco, acompanhada pelo simpático Jaílson de Souza, há seis anos na Estação, onde tornou-se vigia ambiental e guia de aves. Com muito interesse, e grande sensibilidade para escutar e identificar os pássaros, foi Jaílson quem descobriu o ninho da harpia.

Em pouco tempo de passarinhada, comprovo que a região é muito rica em biodiversidade e avisto maravilhas, como o arapaçu-de-garganta-amarela (Xiphorhynchus guttatus), a choca-de-sooretama (Thamnophilus ambiguus), a maitaca-de-garganta-azul (Pionus reichenowi), o cabeça-encarnada (Ceratopipra rubrocapilla) e diversas espécies de beija-flores, como o de garganta-azul (Chlorestes notata), o roxo (Hylocharis cyanus), o de fronte-violeta (Thalurania glaucopis) e o rabo-branco-rubro (Phaethornis ruber), que ilustra o destaque deste texto, além do filhote da harpia no ninho.