Na casa dos pica-paus

Ao chegarmos à sua casa de campo no Uruguai, onde passaríamos o recesso de final de ano, nosso amigo foi logo avisando, entre as explicações de como funcionavam as coisas lá: “uma família de pica-paus mora no forro da casa. Assim, não se assustem com o barulho das bicadas na madeira ao amanhecer”. E apontou para um buraco na parede, ao lado da luminária externa.

O pica-pau nos esperava na   árvore na entrada da casa

O pica-pau nos esperava na árvore, na entrada da casa

OK. Recado dado e eu, que passava as férias de infância na fazenda da minha avó, no sul da Minas, e para onde viajo sempre que posso, estou acostumada aos ruídos de animais, como aves e morcegos, no forro.

Não precisamos esperar o amanhecer e, já no final daquele mesmo dia, fomos recepcionados pela dupla de pica-paus-do-campo (Colaptes campestris) em galho na árvore na entrada da casa. Piavam estridentemente. Seria um ritual de boas vindas ou um protesto por estarmos invadindo o espaço deles e “ameaçando” sua ninhada? Como não compreendemos a linguagem dos pica-paus, procuramos respeitar e não fazer muito barulho. Para não assustar os bebês.

De manhã, começou o simpático toc-toc e o arrulhar das avezinhas no ninho, dentro do forro, com o vai-e-vem dos pais trazendo alimento.  Perdoem-me os muito urbanos, mas acho bem mais agradável despertar desse jeito do que com o barulho de buzinas e freadas, sem falar nas insuportáveis caçambas que ocupam praticamente todas os meio-fios de uma cidade como São Paulo.

Outras aves

As caturritas, sempre em bando e alegres

As caturritas, sempre em bando

Dos pica-paus foi um pulo para o contato com outras aves, como as caturritas (Myiopsitta monachus), parentes (no comportamento e na algazarra) dos nossos periquitos-ricos, que costumamos chamar de maritacas nas cidades brasileiras, os sabiás-do-campo, o lindo príncipe, os também barulhentos e gregários dragões, o falcãozinho quiri-quiri e inúmeros gaviões, entre outras.

Mas não era a família de pica-paus a única moradora tradicional da casa. Logo deram as caras dois teiús, que se aproximaram para delimitar espaço e cobrar umas frutinhas, que devoraram com prazer.

Um pouco mais tarde, os carneiros começam a balir e duas lebres passam correndo e se escondem dentro da moita, deixando a ponta das longas orelhas de fora. Ao anoitecer, uma família de gambás –  mãe e três filhotes – atravessa o campo em um trajeto que logo decoramos e passamos a acompanhar todos os dias antes do jantar.

Punta - carneiros reduzida