A luta para salvar os bicudos, pássaros de canto flauteado

Todo o seu crime – ou pecado, diriam os mais religiosos – foi ter um canto lindo e muito melodioso. Pronto! Logo virou alvo dos caçadores e traficantes de aves. O hábito de ser territorialista, gostando de demarcar uma área de uns 100 metros de diâmetro – que costuma defender com unhas e bicos – e de estar sempre no mesmo lugar, também não ajudou.

Assim, fora em algumas áreas protegidas, como o Parque Nacional das Emas, no sudoeste do Goiás, o bicudo (Sporophila maximiliani ou orizoborus maximiliani maximiliani), um pássaro preto cuja outra característica mais marcante, além do lindo canto, é o bico que lhe dá nome, chegou à condição de “criticamente ameaçado” (CR) pelo Ibama. O órgão ambiental oficial estima que restem apenas não mais do que 200 indivíduos na natureza. No Estado de São Paulo, onde também é conhecido como bicudo-do-norte, bicudo-preto ou bicudo-verdadeiro, foi considerado extinto há cerca de duas décadas, o que levou especialistas a desenvolverem um programa de preservação, com a criação de aves da espécie em cativeiro, para reprodução. O motivo era mais do que justo.

Onze de novembro foi o grande dia: de soltura na natureza, em área protegida no estado da região Sudeste, do primeiro dos dez casais criados em cativeiro dentro do programa de preservação. Quando a porta do viveiro gaiolas foi aberta, as aves, não acostumadas com a liberdade, estranharam e não se aventuraram a ir longe. Aos poucos, foram se arriscando a explorar mais território, sempre monitoradas pelos ornitólogos. Em liberdade, terão que aprender a buscar por alimento e a se defender de predadores, como gaviões e corujas.

O local não pode ser divulgado para não chamar a atenção dos caçadores. Sim, eles ainda existem e são implacáveis, mesmo em pleno século 21 e com tudo o que se divulga sobre a importância de se proteger a nossa biodiversidade. A ganância fala mais alto – um bicudo, em função do seu canto que lembra uma flauta, pode valer cerca de R$ 100 mil.

Força, bicudo! Topetinho Magnífico, seu companheiro no meu livro infantil de mesmo nome, e todos nós estamos torcendo por você! Quem sabe um dia ainda não tenho a felicidade de apreciar o canto de um de vocês em liberdade, em uma das minhas observações de aves?

Príncipe Maximiliano

O nome científico – Sporophila maxiliani – foi dado em homenagem ao príncipe e naturalista austríaco Maximilian zu Wied que veio ao Brasil no século 18, em comitiva da sua conterrânea, a Princesa Leopoldina, primeira esposa de Dom Pedro I. Ela também uma amante da natureza. Obras com as observações e ilustrações de Maximilian podem ser apreciadas em São Paulo, na lindíssima exposição permanente Coleção Brasiliana, no Instituto Itaú Cultural.

E como “sporos” vem de sementes e “philos” de amigo, o nome significa aquele que gosta de sementes de Maximiliano. A informação é do site WikiAves. Isso porque o pássaro habita pastos alagados e arrozais e aprecia as sementes de alguns tipos de capim, como o navalha e o navalha-de-macaco.